A imagem acima de tudo? Os limites da expressão no K-pop
- Rami
- há 2 dias
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No K-pop, onde tudo é imagem e repercussão, idols são treinados para se expressar com cuidado — ou para não se expressar. Desde o período como trainees, muitos aprendem o que dizer em entrevistas, o que evitar em lives, como agir diante de uma câmera ou de um escândalo. Esse é o chamado treinamento midiático, que tem como objetivo proteger os artistas, mas que, em muitos casos, também acaba os silenciando.
Esse tipo de treinamento é, em partes, necessário. Estamos falando de jovens que se tornam referência para milhares de pessoas. Eles influenciam falas, roupas, ideias e comportamentos de uma base de fãs muitas vezes composta por adolescentes. Ter um mínimo de preparo para lidar com essa visibilidade é essencial.
A psicóloga sul-coreana Kim Ji-won, que pesquisa o impacto da cultura pop entre jovens, explica:
“Quando uma figura pública influencia milhões de adolescentes, é necessário que ela entenda o peso da própria imagem. O treinamento não deveria ser uma censura, mas uma forma de orientar com responsabilidade.”
Quando a orientação é necessária — e quando ela falta
Existem situações em que o treinamento midiático é fundamental. Especialmente quando se trata de temas delicados como racismo, apropriação cultural ou estereótipos ofensivos, é urgente que os idols recebam formação adequada para evitar comportamentos prejudiciais — mesmo que sem intenção.
Um exemplo recente foi a live do grupo Kiss of Life, que gerou controvérsias ao reproduzir trejeitos considerados estereotipados de pessoas negras. A repercussão negativa acendeu um alerta: não basta treinar sobre como evitar polêmicas — é preciso formar artistas conscientes do impacto que suas falas e atitudes têm.

Segundo um levantamento do jornal The Korea Herald, entre 2018 e 2024, ao menos 14 grupos de K-pop foram acusados de apropriação cultural, e a maioria dos casos teve origem em comportamentos sem contexto histórico ou cultural.
O professor Lee Dong-yeon, da Korea National University of Arts, comenta:
“A indústria muitas vezes prioriza a imagem limpa, mas ignora a educação crítica. A falta de formação em diversidade é uma falha estrutural que prejudica tanto os idols quanto o público.”
Quando o medo fala mais alto
Por outro lado, há episódios que mostram como esse controle pode ser sufocante. Recentemente, Karina, do aespa, publicou uma foto usando uma jaqueta vermelha com o número 2. Em plena época de eleições, isso foi associado a um partido político conservador sul-coreano. Mesmo sem qualquer declaração política, a postagem foi apagada e a empresa emitiu um pedido de desculpas.

O jornalista político Choi Min-sik, da emissora MBC, explica por que até uma cor vira controvérsia:
“Durante as eleições, cores e números têm forte conotação política na Coreia. Mas a reação extrema das empresas mostra o medo da repercussão. Existe um receio constante de que qualquer associação, mesmo acidental, seja lida como posicionamento.”
Esse tipo de situação reforça a ideia de que os idols vivem sob um padrão de neutralidade forçada. Muitos acabam reféns de uma lógica em que qualquer gesto pode ser interpretado — e, por isso, devem se omitir o tempo inteiro.
Formadores de opinião sem voz
O mais irônico é que, mesmo sem liberdade para falar, idols continuam sendo formadores de opinião. Jovens, muitas vezes menores de idade, têm sua imagem replicada ao redor do mundo. Eles ditam comportamentos, mas raramente podem compartilhar suas próprias opiniões.
A ex-funcionária da indústria do entretenimento Kim Yuna, que trabalhou por anos no setor de relações públicas da SM Entertainment, observa:
“Nos Estados Unidos, o media training serve para empoderar o artista. No K-pop, ele muitas vezes serve para silenciar. E isso tem um custo emocional enorme para quem vive a pressão do perfeccionismo.”
Conclusão: controle ou formação?
O K-pop é uma indústria de impacto global. O treinamento midiático é parte da engrenagem — mas não pode ser uma mordaça. Precisa ser uma ponte entre a figura pública e o ser humano. Preparar idols para lidar com a mídia é importante. Mas permitir que eles existam como indivíduos dentro da imagem pública também é.
Se o foco continuar sendo apenas apagar possíveis riscos, sem investir em formação real, a indústria seguirá produzindo estrelas perfeitas — mas cada vez mais distantes da autenticidade. E, em tempos onde o público valoriza a verdade, talvez esse seja o maior risco de todos.
Se quiser, posso transformar esse texto em um post resumido para Instagram ou um roteiro para vídeo.
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